terça-feira, 9 de abril de 2013

Tapera



 
Foto de Nenzão - Tapera de Bibi
Clareada de querosene da bonança,
Lamparina pavio da saudade
Um retrato ampliado esquecido
na parede encardida do tempo.
Fogão a lenha, evola fumaça de esperança.
Panelas de barro a fumegar,
na cozinha iguaria solidária e prudente,
a cantareira sustenta o pote
água decantada na quartinha
na sala da infância inocente.
Galos acordam o caboclo dolorido
sono pesado  da sobrevivência
herança do campo desprovido,
quebra o jejum com leite mungido.     
O silêncio quebrado com o aboio, um festejo,
o badalar dos chocalhos, batidas das canelas,   
Pote de decantar água 
 
o estalar dos chicotes dos vaqueiros,
suave carinho  no ouvido sertanejo.

Mulheres lavam, passam e bordam
a vida, com entusiasmo e perspectivas,
nas curvas das veredas tecem
labirintos, bordados, rendas, varandas,
cozem iniciativas nos ninhos de alternativas.
Banham seus corpos nus,
no ventre do açude,
nos beirais do rio doce enche a moringa;
escaldadas das secas se refrescam
no colo carinhoso da cacimba.
Jarra d’água na cabeça
tabuada recitada na ladeira
lá fora o crepúsculo, a cancela, a porteira.
À noite no alpendre da Tapera
as estória de trancoso e assombração,
as cantorias e as debulhas de feijão.
O silêncio e as trevas
convidam ao  exercício espiritual:
o terço, a ladainha cantada,
o ofício da semana santa
libertam almas alteradas.
A dor saída do vermelho do verão 
esmaga o barulho do poema,
faz lembrar que tudo isso vivi
e fui feliz nessa lírica cena.       







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